quinta-feira, 5 de março de 2015

Tridosha e os cinco elementos

            Segundo a ayurvédica, cada pessoa é vista como um ser único. A sua individualidade advém de um simples combinação dos cinco elementos primários: éter ou akasha, ar ou vayu, fogo ou tejas, água ou apa e terra ou prithvi. Tal como na natureza, também nós temos estes cinco elementos connosco, que derivam de um imanifestado e indiferenciado princípio criativo, do qual são igualmente a expressão. Este princípio criativo é Uno e deve ser compreendido num sentido material e num sentido subtil.


·         O elemento terra pode ser encontrado não só nos terrenos do nosso planeta, mas também no baço e no ferro dos glóbulos vermelhos. Ele confere a qualidade de estabilidade à mente, ou seja, a força moral. É um decidido, silencioso e lento avanço para atingirmos os nossos objetivos e a capacidade de resistência às manifestações e reações dos outros.
·         O elemento água interfere nos aspetos coesivos da realidade que fluem para dentro e mantêm as coisas juntas, o que se encontra perfeita e simplesmente testemunhado na ubiquidade da molécula H2O.
Os outros elementos também foram entendidos pelos antigos médicos vaidyas como elementos que comunicam o princípio universal inerente a um elemento particular.
·         O elemento fogo é a força universal que está presente na natureza, que produz calor e irradia luz. Dá-nos a paixão necessária para prosseguir até atingirmos os nossos objetivos, apesar dos obstáculos e dos atrasos. É o que arde fora da capa da ignorância (avidya) e permite que a verdade brilhe com esplendor. O fogo retira as dúvidas da substância-mãe do coração humano e substitui-as pela alegria.
·         O elemento ar é força transparente, rarefeita, cinética que põe o universo em andamento. Move o sangue através das veias, os desperdícios para fora do corpo, os pensamentos através da mente, bem como os pássaros para climas mais quentes no inverno ou os planetas à volta dos seus sóis.
·         O elemento éter é o mais subtil de todos. Está em todo o lado e toca tudo. Na mente é o recetáculo de todas as impressões e no coração aceita o amor. O éter é recetividade e não resistência a tudo o que é verdade.
Deste modo, estes cinco elementos subtis (pancha mahabhutas) formam a base para todas as coisas encontradas na criação material, do grão de areia à complexa fisiologia de todos os seres humanos vivos. Equilibrando estes elementos na justa medida para cada indivíduo, obtém-se a chave para manter a saúde e tratar as doenças, sejam de ordem física, mental ou espiritual.
Qualquer um destes cinco elementos se encontra no nosso meio ambiente, no universo material, em todas as escalas, tanto orgânicas como inorgânicas, desde um grão-de-bico a um planeta. Por isso, sofremos a sua influência. OS alimentos que ingerimos e o tempo são apenas dois exemplos da sua presença. Quando entram na biologia de um organismo vivo, no homem, por exemplo, adquirem forma biológica. Estes cinco elementos que existem em nós combinam-se entre si de modo a criar várias funções fisiológicas. É através das combinações entre eles que se formam os três princípios básicos ou doshas (tridoshas) que se encontram na natureza: vata (ar), pitta (bílis) e kapha (mucosidade), os quais indicam, respetivamente, movimento, calor e estabilidade. Articulados de modos diferentes, determinam a individualidade e a constituição mente/corpo de cada ser. O tridosha regula todos os processos fisiológicos e psicológicos num organismo vivo.
A ação combinada entre estes princípios determina as qualidades e as condições dos indivíduos. O estado de harmonia dos três doshas cria equilíbrio e saúde. Um desequilíbrio tanto pode ser um excesso (vrddhi)  como uma deficiência (ksaya) e manifesta-se como um sinal ou sintoma de doença. Estes três princípios originários da ayurvédica constituem a natureza química de qualquer ser vivo e foram forjados pelos cinco elementos da natureza, sendo cada um deles composto por dois elementos da seguinte forma:
·         Os elementos éter e ar formam, quando combinados, o temperamento vata, que governa o princípio que dá origem e controla todos os movimentos do corpo, podendo ser visto como a força que comanda a circulação e a corrente de impulsos nervosos de e para o cérebro, bem como a respiração e a eliminação. Vata dosha tem a mobilidade e a rapidez do espaço e do ar.
·         Os elementos fogo e água formam, quando combinados, o temperamento pitta, responsável pela digestão e assimilação dos alimentos por parte do corpo, bem como pelo processo de transformação e de metabolismo não só dos órgãos e dos tecidos, mas também celular. Pitta dosha possui as qualidades metabólicas do fogo e da água.
·         Os elementos água e terra, quando combinados, formam o temperamento kapha, responsável pelo crescimento e pela proteção dada através das membranas mucosas. É o caso, por exemplo, da proteção feita pelos fluidos que vão da espinal –medula para o cérebro ou da proteção que as membranas mucosas do estômago conferem aos seus tecidos. Estes dois elementos promovem também a estabilidade de toda a estrutura óssea. Kapha dosha é, portanto, a estabilidade e a solidez da água.
Pode ainda predominar vata-pitta, a combinação do ar com a bílis; pitta-kapha, a combinação da bílis com a mucosidade; ou vata-pitta-kapha, onde prevalecem, por igual, os três doshas. Dada a complexidade da composição de cada ser vivente, pode-se deduzir que se se considerar as variações proporcionais de vata, pitta e kapha existe uma inumerável quantidade de temperamentos. Por isso se depreende com facilidade que cada ser é único e deve ser tratado de modo único. Assim sendo, podemos concluir que todos os componentes do corpo físico pertencem a um dos cinco elementos:
·         Ao elemento terra pertencem os ossos, a carne, a pele, os nervos e o cabelo;
·         Ao elemento água pertencem o sémen, o sangue, a gordura, a urina, as mucosidades, a saliva e os líquidos linfáticos.
·         Ao elemento fogo pertencem a fome, a sede, a temperatura corporal, o sonho, a letargia, a inteligência, a ira, o ódio, o zelo e o brilho;
·         Ao elemento ar pertencem todos os movimentos: a respiração, as necessidades fisiológicas, a função sensório-motora, as secreções e excreções e a transformação dos tecidos;
·         Ao elemento éter pertencem o amor, a inimizade, a timidez, o medo e o apego.
Tudo isto nos alerta para o facto de estas forças, quando em equilíbrio, serem o suporte da vida. Porém, se estiveram em desequilíbrio, são agentes de doenças e de miséria.
            A constituição dos três doshas no corpo determina o conjunto de atributos, tendências e traços pessoais. Também nós da a conhecer as necessidades de cada indivíduo em relação à saúde, felicidade, dieta a seguir, tipos de exercícios favoráveis e clima apropriado. É importante lembrar ainda que o temperamento de cada indivíduo, o prakriti, é estabelecido no momento da conceção. No entanto, o invólucro químico que se forma em redor do óvulo fertilizado desempenha um papel relevante na construção da natureza psicossomática de cada pessoa.
            Os desequilíbrios no temperamento, conhecidos como vikriti, produzem-se pela intervenção do indivíduo com o seu meio ambiente. Por isso a ayurvédica trata cada ser de forma simples, diferente e única, pois cada um tem código exclusivo, compostos pelos três doshas. Para corrigir os desequilíbrios nos doshas (vata, pitta, kapha), a ayurvédica surge determinado estilo de vida e normas de alimentação, de modo a reduzir o dosha excessivo. Também aconselha certos suplementos à base de ervas e chás medicinais para acelerar o processo de cura.
            É indispensável frisar que é através dos doshas que o organismo humano aceita variáveis trocas ambientais e recebe energia dos alimentos. A tarefa dos doshas concentra-se sobretudo na região entre o coração e o umbigo, onde interagem continuamente, ocupando-se do desenvolvimento e da autoconservação do corpo.
            Qualquer perturbação nos doshas gera de imediato uma falta de equilíbrio no corpo e interrompe a eliminação das toxinas e demais substâncias que estejam em excesso. Quando o organismo estiver nesta condição de desequilíbrio e com excesso de toxinas, a ayurvédica recomenda um processo de limpeza conhecido com panchakarma, que procederá a eliminação das mesmas.
            Um equilíbrio harmonioso dos três doshas é essencial para a manutenção do bem-estar físico e mental. A perturbação de qualquer um dos doshas gera desordem e doenças no organismo. Devido ao papel fundamental que o sistema dos três doshas desempenha na regulação, conservação e desenvolvimento dos nossos corpos, qualquer terapeuta profissional de ayurvédica deve estudá-lo em profundidade. O exame do pulso radial é essencial para determinar o temperamento de uma pessoa. O massagista deve conhecê-lo para saber qual dos doshas está afetado e com isso poderá selecionar o óleo mais adequado ao tratamento.
            O estado químico do nosso corpo varia de acordo com determinados fatores, tais como o lugar, o clima e a dieta. Subjacente aos mesmos, que podem variar diariamente, existe o nosso temperamento de base, que é uma cópia heliográfica e química sobre o qual o organismo foi construído. Este código genético estabelece muitos aspetos de um indivíduo: as suas afeições e aversões, a eleição dos alimentos e as suas preferências quanto ao gosto, aroma e temperatura. Desta forma, poderemos, ao executar um tratamento, escolher ou não um tipo específico de óleo. Essencialmente, nos tipos vata e pitta, o terapeuta teria melhores resultados se fizesse uma massagem com óleo, bastante benéfica para estas pessoas. Por outro lado, nos tipos kapha, a massagem deve ser executada sem o recurso ao óleo, mas sim com algum género de azeite curativo especialmente preparado.
            Os conceitos e conhecimentos sobre os quais a ayurvédica se alicerça demonstram que somos, de facto, seres únicos no que respeita à saúde e explicam, desta forma, as diferentes reações de cada organismo perante as situações mais adversas.

            À medida que se vai aprofundando o conhecimento dos conceitos e filosofia da ayurvédica, e principalmente à medida que se vão aplicando na vida quotidiana as suas técnicas, começamos a permanecer constantemente saudáveis e a adquirir também uma visão interior mais rica, que leva à perceção do grande milagre divino ao qual se chama vida.

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